Doação foi algo que marcou meu entendimento na pandemia. Passei a mirar no jardim de casa, na partitura da flauta, na gravura nas horas especiais. Um jardim não deixou de dar os seus frutos, a partitura foi sendo interpretada e a gravura desvelou para mim suas amarras e suas liberdades.
De perceber a natureza da vida vegetal, sua doação, o único lugar sem máscara da face da terra, decidi ver as plantas, sua visualidade e sua beleza. Intentei ir ao âmago que poderia perceber da visualidade vegetal, sem a condição ilustrativa científica. Busquei a imagem, a expressão e os elementos visuais que eu ensino, e para isso, novamente a gravura me deu suporte de verdade intrínseca do fazer artístico. Pois se um ser humano ensina e não faz o que ensina é mero tapeador ativo. Se não acredita no que ensina não é ainda pior?
E com olhos sem preconceito vi as flores do jardim de dentro, do coração e da casa. Da calçada das poucas ruas que passava, das plantas dos locais de apreço e lugares de afeto como da área 3 da PUC-GO. Foi assim, vendo as plantas que se doam sem palavras a vida, o ar puro que tanto necessitávamos, que mirei as plantas, a sua beleza doadora, o no seu desprendimento tranquilo. E vi que o mundo pode acabar mas as convicções de fé se cumprem. A dor por todos nós humanos enlutados, doentes e roubados por corruptores no pior da crise, me fez voltar para a natureza (vegetal) e ver nelas que a vida continua e que doar sentido e significado ao mundo é tarefa de quem sente.
Mirar a essência da natureza me faz voltar para a verdadeira essência humana do servir, doar ao próximo. Da percepção de que somos os vitoriosos, veio a esperança e a coragem, pois essa história ficou em nossa mão para contá-la a novas gerações. Eu, não preciso fazer da arte um escudo ou um rifle, ou ter nela o meu ódio encoberto ou revelado. Quero mostrar meus olhos, ainda que limitados, que veem a maior expressão artística nascendo do olhar, do coração e não da teorias não artísticas. Não nasce do engajamento ou da exclusão do discurso, entre cores e gêneros, mas de ver pelos elementos dela e por eles transmitir sentido, significado que possa alimentar os olhos de paz, confiança e plenitude sem preconceitos a este ou aquele. Todos somos humanos e carecemos da esperança, fé e coragem. Este olhar nasce de um chamado para ver, sentir e permitir que se vejam através deles em expressão criativa. E, meus olhos não querem se alienar da realidade, jamais! Mas sair do desespero instalado, do diagnóstico mal elaborado, das narrativas cabais. Desejo superar anomias com meu agir poético doando expressão, conteúdo e significado pois "a arte não tem sentimento, mas faz sentir", "um lugar verdadeiramente máscaras".
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